Há 20 anos trabalhando no Edifício Martinelli, Edison Cabral virou parte da história do prédio. Contratado inicialmente para cuidar da portaria daquele que havia sido o maior arranha-céu da cidade, Cabral transformou as curiosidades que tinha sobre o prédio em missão de vida. Começou a pesquisar sobre o Martinelli e nunca mais parou. Hoje ele é considerado um historiador do edifício. Para compartilhar tantas histórias, Cabral conversou com o Papo Urbano diretamente do famoso terraço no 26º andar. Desde seu primeiro contato com o prédio a fantasmas “reais”, a relação entre Cabral e o Martinelli vai muito além do trabalho. Como e quando você começou a trabalhar no Edifício Martinelli? Em 2001, fui convidado por um amigo para trabalhar aqui. Antes eu administrava o Mercado Municipal da Penha. Tinha o propósito de trabalhar na SP Urbanismo, que na época era a EMURB, ou na Secretaria de Habitação. Então, o síndico me procurou e disse que não tinha vaga para mim nessas duas áreas, mas somente na portaria do próprio condomínio. Eu disse a ele: “Olha, eu vim aqui para trabalhar, não pra escolher função, então estou à disposição!”. E essa foi uma das melhores escolhas que fiz, pois foi quando dei início a uma experiência que transformou a minha vida. Como surgiu o interesse pela história do prédio? Sempre ouvi falar do Martinelli, mas conhecia apenas a parte de fora dele. Então quando eu vim trabalhar aqui, eu me interessei muito, porque as pessoas falavam e perguntavam muito sobre ele, queriam saber sobre visitação, sua história… Quando eu cheguei, a história não era nada documentada. Foi quando eu e minha mulher começamos a pesquisar e registrar as informações sobre o prédio, e esse nosso trabalho foi reconhecido como a história oficial do Martinelli. Quando você se tornou um historiador oficial do Martinelli? Em 2010, foi criado um programa de visitação. Eu já tinha feito algumas pesquisas, mas foi nesse momento que passei a intensificar a busca pela memória do prédio. Foi um presente que eu recebi e aceitei na mesma hora. A pesquisa não parou até hoje, afinal, além de um historiador, eu sou um pesquisador, então, se tem Martinelli, eu estou indo atrás. Mesmo com todos esses anos de pesquisa, eu não posso dizer que sei tudo sobre ele. Tem hora que aparece uma nova informação lá no Rio de Janeiro, onde o Comendador (Giuseppe Martinelli) chegou ao Brasil vindo da Itália. Às vezes, também aparecem novidades sobre ele em Santos. Então sempre tem coisa nova. Você tem alguma história curiosa que aconteceu no prédio para compartilhar? São muitas histórias. Comecei como porteiro, passei para segurança, supervisor geral e, hoje, relações públicas e historiador. Mas uma história que me marcou muito foi a ‘Loira do Martinelli’. Desde os tempos de escola a gente ouvia falar sobre a lenda da Loira, mas o que muita gente não sabe é que ela foi um fato real aqui. Na década de 1990, um pessoal da limpeza veio trabalhar aqui, e no meio deles, havia uma mulher loira e um rapaz jovem. Ele estava todo feliz, trabalhando, cantando… Até que, de repente, quem apareceu para ele? A loira! E ele não pensou duas vezes, pegou a vassoura e começou a bater no “fantasma”. Os colegas de trabalho intervieram e falaram: “fulano”, ela trabalha aqui! O rapaz achou que era um espírito, acertou o “fantasma”, mas era apenas uma colega de trabalho. Esse é um fato sempre contamos nos passeios e visitações. E sobre a construção do prédio? Quando o prédio iniciou eram 247 apartamentos. Eles não existem mais e deram lugar O que torna este prédio tão único e especial? Esse prédio serve como uma escola para todos nós. Não importa a sua função aqui, quando você está dentro do Martinelli, você aprende sobre arte, sobre o Brasil, sobre a Itália… Este edifício mudou muito a minha vida. A partir do momento que eu pisei aqui, eu tomei gosto pela história e, desde então, quero buscar, ler, aprender sobre tudo, não apenas sobre coisas relacionadas ao prédio. Imagina o Comendador, que chegou aqui com 19 anos, construiu um arranha-céu e deixou este legado para nós. Fico muito feliz de ser um historiador oficial do prédio e levar com muito amor essas informações para as pessoas. Você se vê fazendo alguma outra coisa que não seja atuar como historiador do Martinelli? Com os meus quase 59, não me vejo fazendo outra coisa. É um trabalho que sempre tem campo, coisas novas para explorar e novos fatos para serem descobertos. Meu desejo é seguir fazendo o que faço, e, se Deus quiser, quero morrer trabalhando como um historiador do Martinelli. Foto e texto: Filipe Saochuk (SMUL)
às salas. É uma loucura tentar, por exemplo, precisar o número de salas que existem aqui hoje. Se eu tivesse que chutar um número, provavelmente diria que são mais de mil salas ao todo. Esse prédio é um gigante, foi o primeiro arranha-céu com 30 andares, contando São Paulo, Brasil e América Latina, o prédio mais alto do mundo por dois anos e um dos maiores em concreto armado. É um edifício que o mundo conhece. Já falei dele para pessoas de diferentes países. Já recebemos aqui televisões de fora, turistas de todos os cantos do mundo, como Índia, Cazaquistão, China. Eles conheciam o prédio, chegavam aqui e se encantavam pela história, a arquitetura, o terraço e sua vista espetacular. O mundo inteiro sabe sobre o Edifício Martinelli, e sou muito feliz em fazer parte dele.